sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Risco, oportunidade, volatilidade, preço e valor

Há anos que não víamos um ambiente com tanto pessimismo e medo juntos afetando os mercados mundiais. Diferente de 2008, que acabou pegando todo mundo de surpresa; no ano de 2011 tudo que aconteceu foi previsto. A desaceleração do mundo, muito por causa dos processos de desalavacangem, a péssima situação da Europa que pela primeira vez desde a criação do Euro teve de colocar seu sistema de decisões à prova e a economia americana, que mesmo com a injeção de liquidez constante andou de lado. Nada de novo, nada de surpreendente, mas com conseqüências psicológicas avassaladoras.

Quando conversam conosco sobre o que acontecerá com o mundo, as incertezas geradas pela comunidade européia e como isto afetará o mercado, a resposta quase sempre é a mesma: o que acontece hoje é mais um efeito da incerteza de como virá uma solução, do que da perspectiva de caos propriamente dito. Não faz sentido, nem é viável, que os europeus cortem de repente todos os benefícios de suas redes de amparo social (muito custosas), ou aumentem dramaticamente os impostos (que já são altos) e entrem em um processo irreversível de arakiri econômico. A solução virá e toda a incerteza que hoje leva os preços dos ativos para baixo em breve será coisa do passado, como já aconteceu diversas vezes. Não vermos uma luz no fim do túnel não significa que ela não exista.

E mesmo quando pensamos sobre o Euro, esquecemos que o conjunto é mais forte que suas unidades separadas. Uma frase do economista Charles Gave, responsável pela empresa de pesquisa econômica GaveKal, ajuda a explicar um pouco o que isto quer dizer: “a economia francesa não é competitiva, mas muitas empresas francesas são”. O que é verdade para quase todos os países da comunidade européia. Quando falamos de Tractebel, Hermés, Luxxótica, Siemens, BMW, até Inbev, estamos falando de empresas globais, que por uma questão circunstancial estão na Europa, mas possuem suas receitas e crescimento fora da região do Euro. Seus mercados não estão mais limitados ao que acontecerá com a renda de Itália ou Grécia, por exemplo. E isto deve ser levado em consideração quando resolvemos simplesmente ignorar os fatos, assumir perdas sem motivo e nos protegermos de uma Tsunami que nem mesmo foi detectada ainda.

O viés negativo das pessoas, como já foi demonstrado por Kahneman, afeta muito mais do que qualquer possiblidade de ganho. A possibilidade de perda pode causar até dor física, enquanto a felicidade gerada por um ganho é quase esquecida no minuto seguinte. Este é um mecanismo de defesa do nosso cérebro que provavelmente nos ajudou a sobreviver nos últimos 200 mil anos, mas certamente provoca decisões erradas quando o assunto não é fugir de um predador, mas decidir sobre o melhor tipo de investimento.

O efeito deste processo todo é que tornou 2011 o ano em que os ativos de renda variável tornaram-se muito mais atrativos para aquisição do que jamais estiveram desde Novembro de 2008. Quando compramos companhias, depois de meses ou anos analisando-as, pouco deveria importar o que acontecerá nos próximos 6 meses, mas sim, como esta empresa performará nos próximos 5 anos.

Poderíamos ter mantido empresas em nossos portfólios que não caíram nada. Isto daria a ilusão de que passamos incólumes pela crise e nossas posições foram vencedoras. Existem vários exemplos como Helbor, Tegma e até Itaú que não sofreram ano passado. Mas se formos um pouco mais fundo poderíamos pensar que se somos gestores focados em valor e não nos aproveitarmos de momentos como este para adquirirmos participações em companhias que podem nos gerar 2, 3 ou 4x de retorno em 5 anos, será que estaríamos executando bem nosso mandato? Ainda mais se pensarmos que a opção para isto seria mantermos 25% do fundo em caixa, esperando por algo que não sabemos quando e se vai acontecer.

É radicalmente diferente hoje do que no fim de 2007 quando não tínhamos muitas opções para comprar. Os preços de muitos ativos quando vistos sob o prisma de sua geração de resultados estavam completamente fora de qualquer racionalidade mínima. As pessoas discutiam a capacidade das empresas estarem valendo 15, 18x seu lucro operacional como se isto fosse normal. Mas não era.

Hoje é o contrário. Encontramos diversas boas oportunidades, mas a incerteza quanto a economia do mundo e seus efeitos deletérios sobre o Brasil, por mais incertos que sejam, levam ativos de extrema qualidade a serem precificados como se fossem companhias quase falimentares, sem contratos de fornecimento de longo prazo já assinados, sem uma gestão competente e alinhada, e sem colocar em pauta que apesar da crise, existem muitas companhias que estão indo de fato muito bem.

Existem poucas coisas certas na vida. Para investidores casuais e pessoas comuns, a maioria das certezas que os fazem falar sobre seus investimentos em longos jantares ou reuniões de família para nós são somente o mais puro espectro da incerteza e da forma atabalhoada que o ser humano de forma geral lida com o tema investimento. “Valores podem evaporar da noite para o dia, estimativas podem estar erradas, circunstâncias mudam e certezas podem falhar”, diz Howard Marks, CEO da Oaktree, value investor, e que tem sob sua gestão mais de USD 80 bi..

Até agora, o que podemos dizer que sabemos com certeza é que os movimentos econômicos que dependem de seres humanos são cíclicos. E são desta forma, pela própria natureza humana. As pessoas são sentimentais, emocionais e inconstantes. Não são racionais, clínicas e consistentes em seus pensamentos e conclusões.

Existe o progresso e depois a deterioração, as empresas vão muito bem e depois de um tempo, as condições que as fizeram ir bem são as mesmas que as fazem ir mal, e o ciclo se inverte. Vícios e virtudes são como um pêndulo do mesmo relógio, pois quando se está em uma ponta, a energia potencial acumulada para se chegar até lá é a mesma que fará o pêndulo ir para a outra ponta; e isto sucessivamente.

Ciclicidade é inerente ao ser humano. Partindo desta premissa, se você investe a longo prazo, deixar de investir em setores cíclicos, na maioria das vezes é deixar de investirem qualquer coisa. Da mesma forma, focar o portfolio em setores cíclicos é mais ou menos como não focar em nada. O fato é que nós não conseguimos prever os ciclos com a certeza que pensamos que conseguimos, apesar de muitas pessoas acharem que conseguem. Não temos acesso a todas as informações e variáveis que farão o pêndulo chegar ao seu ponto máximo para depois retornar. Podemos estimá-la e tentar prevê-la, mas a linha que divide este tipo de análise de nenhuma análise é de fato muito tênue.

Contudo, se sabemos que a economia é cíclica e que nossos esforços de previsão serão na maioria das vezes em vão, o melhor que podemos fazer é nos preparar para estes momentos da melhor forma possível. E mesmo esta preparação não é trivial pois ainda temos aquele pequeno problema de sermos humanos e nossas decisões estarem sujeitas aos nossos valores, humores e intempestividades.

A forma de nos prepararmos é primeiro sabermos do que queremos nos proteger. Para nós, queremos primeiro nos proteger não da volatilidade, mas da perda definitiva. E isto não tem a ver com preço das ações na Bolsa, mas com o valor intrínseco do ativo, aquilo que o define por ser o que ele é e não uma foto de um momento.

Como achar as empresas com o menor risco, ou probabilidade, de perderem valor de forma permanente?

A melhor forma que encontramos de nos protegermos deste risco é comprando barato. Comprando quando o valor intrínseco do ativo, produto sempre de muito estudo e dedicação, é muito superior ao seu preço em bolsa. Por vários motivos. Comprar barato é muito diferente de considerar que uma empresa vai crescer por causa dos fatores X, Y ou Z. Comprar barato é aproveitar-se de momentos em que distorções aparecem, e adquirirmos participação em negócios sólidos, bem geridos, geradores de caixa e com histórias de sólida geração de valor para seus acionistas a um valor muito abaixo do que qualquer premissa pessimista poderia prever.

E este tipo de trabalho de pesquisa não é uma ciência exata onde somente somamos e subtraímos alguns números, fazemos um fluxo de caixa projetado e voillá !! Aqui está quanto vale a empresa.

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