sexta-feira, 24 de junho de 2011

Uma breve explanação sobre a situação da economia americana hoje

Fico pensando se estamos indo em direção a uma montanha, sem possibilidade de desvio, ou se a situação econômica dos EUA hoje é somente algo transitório. Tenho estudado bastante o assunto e o que mais faço é tentar determinar quais indicadores são importantes e porquê. A quantidade deles inclusive mais atrapalha do que ajuda mas neste post, vou tentar colocar os que acho relevantes neste momento.

Os últimos números de desemprego da economia americana foram desanimadores. Mais desanimador ainda foi a resposta do FED sobre sua incapacidade de mudar o cenário no curto prazo, tendo em vista que novos incentivos fiscais sejam a medida que transformará o remédio em veneno.

Bernanke está pensando em novo incentivo fiscal. A primeira questão que coloco é se o FED não pode fazer nada mais, quem pode ? E lembro-me da frase de Mark Twain: "se todos os seus problemas se resumem a um prego, todas as soluções se resumirão a um martelo". Será que não está na hora de ir mais fundo nas causas e parar de tentar resolver só os efeitos ?

Os últimos números relativos a habitação mostram que os preços dos imóveis começaram a declinar mais uma vez. A compras de imóveis novos caíram e o consumo das famílias nos últimos 6 meses está baixíssimo. Além disso, no primeiro trimestre o crescimento do PIB foi de pífios 1,8%, enquanto o mercado tinha uma expectativa de 3%. Para este ano, a expectativa agora é que a economia cresça 2%. Menos do que o necessário.

O efeito mais direto desta falta de crescimento está no que pode ser chamado hoje de a âncora que não deixa a economia americana se mover. O desemprego não recua. Em Maio foram criados 54.000 empregos novos e a expectativa era que fossem criados 110.000. Pior do que isto, para que o desemprego baixe dos atuais 9,1%, são necessários mais de 200.000 empregos novos por mês. Estão sendo criados pouco mais de 25% disto, mesmo com toda a injeção de capital que houve na economia.

Segundo alguns economistas que andei lendo em revistas e papers estrangeiros, a economia americana precisa crescer 3,3% ao ano e gerar uma média de 187.000 novos empregos por mês para que em 2020 tenha uma taxa de desemprego próxima a 5%, ainda acima de sua média histórica. Com os níveis atuais, em 2020 eles estarão no máximo na metade deste caminho.

Daí vem outra pergunta: as empresas americanas estão perdendo dinheiro ? Afinal, se não estão contratando, algo deve estar acontecendo. No quarto trimestre de 2010 o lucro das empresas americanas foi de USD 1,68 trilhões. A questão é que estão investindo muito mais fora de seu país de origem do que dentro.

Como o desemprego está alto, os salários pagos aos americanos também está caindo e desde a grande depressão de 1929 a criação de empregos nunca foi tão baixa quanto entre os anos de 2000 a 2007. O índice de desemprego entre jovens de 17 a 24 anos nunca esteve tão alto também. De uma média anual de 9% hoje está por volta de 24%. Este inclusive é um dos motivos que está jogando o valor absoluto dos salários para baixo. Nesta faixa etária, os salários já caíram em média 20% desde 2008.

De 1990 a 2008 os setores de atuação global quase NÃO criaram novos empregos nos EUA. Bancos, manufatura, exportadores, energia e serviços financeiros tiveram uma enorme expansão de lucros porém sem investirem em mão de obra em seu país de origem. Os setores voltados ao mercado interno, protegidos da competição global, foram os responsáveis pelo grosso da geração de empregos. A questão é que estes setores também são os que demandam as menores qualificações e por isto, os menores salários. Estão entre eles os setores de Healthcare, Hoteis, Varejistas e agências governamentais.

Sem uma mudança na política industrial americana será muito difícil que as empresas voltem a investir pesadamente dentro do país. Somente planos de ajuda financeira e fiscal estão dando vantagens mais as empresas do que aos cidadãos; vantagens estas que estão sendo transferidas para fora dos Estados Unidos. Enquanto isto, nenhum plano concreto foi proposto para melhorar o nível de negociação de hipotecas entre mutuários e bancos (muito vantajosas para os bancos ainda) ou mesmo, um TARP para os donos de casas, que continuam com enormes dificuldades de manterem suas hipotecas em dia.

Daí entramos no sonho americano de criação de negócios. O motor da liberdade americana, como dito por eles, é a capacidade criação de novos negócios como catalisador econômico. Lemos muito sobre isto. Mas é verdade ?

Desde 1980 a criação de novos negócios está em contração. Interessante notar que é no mesmo período que os bancos tornaram-se o centro da economia americana. É possível que o mercado financeiro tenha sugado a maior parte dos bons cérebros, pagando tanta performance que o risco de se criar um negócio novo simplesmente não compensa mais.

Além disso, na última década, as maiores ferramentas de financiamento para novos negócios tiveram suas torneiras fechadas. A alavancagem pessoal no cartão de crédito e a capacidade de se fazer uma nova hipoteca de sua casa para começar um novo negócio simplesmente são opções que desapareceram do mercado.

Bem, se não existe criação de empregos, o preço das casas continua caindo, os investimentos das empresas estão sendo feitos fora dos EUA e a única coisa que o governo faz é pensar em incentivos fiscais para as empresas; minha primeira conclusão é que estamos próximos de um ataque populista dos republicanos para voltarem ao poder, através de medidas de impacto meramente financeiro, mas sem nenhuma relevância na forma com as empresas investem. Já estamos vendo isto inclusive.

Vejo também que o déficit americano, apesar da vontade de não o aumentarem, vai subir sim. E isto vai aumentar a vulnerabilidade da economia americana, deixando o dólar cada vez mais fraco e o país mais suscetível a boa vontade dos europeus e emergentes para financiar seu enorme déficit.

Entretanto, estes países ou regiões estão hoje tendo seus próprios demônios para combater afinal, o Japão está escorregando para uma nova recessão por causa do terremoto, os emergentes estão entrando em uma onda de desaceleração de suas economias para conter a inflação (China, Brasil ... ) e os europeus, estes coitados, não conseguem nem cuidar de sua própria moeda, imagine então se tiverem que cuidar do dólar. Isto sem considerar o impacto da alta do preço do petróleo que reduz a renda disponível para consumo e investimentos tanto nos EUA quanto no resto do mundo, bem como o alto preço das commodities que vêm causando aumento de preços dos alimentos também.

Se o aumento de impostos não é uma opção viável, como reduzir a dívida americana em uma economia que cresce menos do que precisa e não emprega quem precisa trabalhar e pagar impostos ?

A Europa de fato vai entrar em uma espiral de financiamento aos seus PIGS sem nenhuma perspectiva de recuperação nos próximos 10 anos ? Sem um calote ao setor privado, administrado ou não, estes países serão um sorvedor de recursos pelos próximos anos. Como lidar com isto sem criar como efeito colateral uma crise de credibilidade de todo o sistema ?

Até quando a China vai financiar sem restrições o déficit americano e manter seu câmbio sobre valorizado que no final, é o que ainda está sustentando seu crescimento bossal nos últimos anos ?

Bem, estas são algumas perguntas que me faço hoje para desenhar como será o futuro. Não estou gostando do que estou vendo e pior, tenho poucos argumentos para dizer que tudo vai ficar bem, a economia vai melhorar e todos vão ficar ricos, felizes e compradores de novo. Os americanos parece que perceberam isto e estão parando de gastar o pouco que possuem. No limite, isto também evita que as empresas vendam mais, invistam e .... contratem mão de obra.

Não consigo sair da seqüência de pensamentos circulares que nos levariam a uma nova reprecificação dos ativos neste novo ambiente com excesso de moeda (incentivos), mas que de fato, possui pouco valor. Não vejo como não deflacionar a economia mundial de forma a colocar todo este endividamento dos últimos 20 anos a patamares minimamente geríveis. O que hoje, podemos ver que não estão.

Que empresas se beneficiariam deste futuro ? Aparentemente as que atendem mercados locais, longe de uma possível queda de demanda mundial e sem a intervenção direta de empresas estrangeiras cheias de caixa, mas fugindo de seus países de origem aparentemente quebrados. Dólares, empresas e compradores americanos e europeus vão continuar vindo para cá. Nossas exportações vão sofrer dos dois lados: falta de demanda mundial e câmbio super valorizado, deixando nosso produto caro. A solução é produzir cada vez mais barato e para isto precisamos não só de investimento, mas educação e reformas política e fiscal.

Em compensação o mercado interno, com esta enxurrada de dólares, tende a se desenvolver com a massa de recursos para investimento que estamos recebendo e por isto teremos aumento de renda e crédito. Teremos também aumento de preços de serviços, que hoje já são um dos focos da inflação. A função do nosso Banco Central e do Ministério da Fazenda será a de direcionar todos estes recursos para infra-estrutura e a construção de um país mais equalitário, educado e próspero.

Surfaremos por alguns anos nesta onde de capital entrante e sinceramente, a desculpa de Olimpíadas e Copa do Mundo me parecem boas explicações para que este dinheiro seja bem gasto. Mas acho que tudo que vem a reboque vai trazer muito mais felicidade se for bem aproveitado. Com mais renda teremos mais condições de investir em educação, afinal as pessoas vão ganhar para pagarem as universidades. Mais educadas poderemos recompor nossa base industrial para algo mais próximo do que as economias desenvolvidas possuem com muita inserção tecnológica e ganhos de eficiência que nos levarão a uma sociedade com mais acesso serviços financeiros, produtos de consumo, bancos, manufatura e habilitação.

Se estiver certo, estamos em uma excelente hora para nos posicionarmos em ações de empresas com as características acima. Talvez tenhamos alguns momento de maior nervosismo, mas não vejo muitos futuros possíveis neste momento.

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