quinta-feira, 7 de outubro de 2010

FAMÍLIA & CASAMENTO: a convivência do possível, não do correto, nem do ideal e nem da felicidade

Já desisti de entender, mas família não é uma composição social para se obter felicidade ou completude. É somente um arranjo social para que o homem possa passar pela vida sem se sentir completamente sozinho. Da mesma forma que acreditamos em Deus, acreditamos na família como forma de suprir nossa incapacidade de entender no fundo, que somos e estamos sós. E a hora de dormir é somente o fechamento disto.

Não quero justificar a minha vida com o falso paradigma de que como todos são umas merdas e eu sou super legal, nada dá certo, mas é porque a culpa é deles. Não é meu estilo e não faria isto.

Mas como é difícil este jogo social de ter que não gostar de alguém mas ser obrigado a conviver. Como é difícil não poder cancelar alguns relacionamentos somente porque existe uma corrente biológioca que une as pessoas. Mesmo sendo elas diametralmente diferentes. Pessoas que no mundo real nunca conviveriam, mal se falariam, mas são obrigadas a esta tortura dia após dia. Dentro do que conheço como religião, isto é o mais próximo do que poderia ser chamado de karma. 

Existe uma falsa forma de resolver isto que é construindo seu próprio núcleo familiar. Possuímos o livre arbitrio para escolher alguém que seja similar a nós mesmos em termos de valores e personalidade para dividir o resto de nossa vã existência. Mas se pensarmos com clareza, isto também é uma fraude suportada pelo excesso de contigente de psicólogos, religiosos, videntes, e todos estes falsários que atráves de ligações nada científicas tentam explicar a complexidade da vida em família. Por que ?

Porque as pesoas mudam ao longo da vida. Seus valores e sua personalidade. Quem escolhemos (e fomos escolhidos) hoje não será mais o mesmo amanhã. A forma como convivem, como interagem com os outros e como suportam a própria existência – que diga-se de passagem não é nada fácil, e para algumas pessoas, quase insuportável.

A convîvência constante com um grupo ou uma pessoa por um longo perído é já meio infernal. Acordar e dormir todos os dias ouvindo as mesmas histórias, a mesma forma de encarar o mundo e no limite as mesmas opiniões sobre os temas da vida é algo para lá de monótono. A sustenção de um casamento por um longo período é a prova cabal que o ser humano tem como característica pétrea a de se acostumar a qualquer situação. Independente se for boa ou ruim, errada ou certa.

Casamentos são o espelho da própria sociedade humana, porém em escala menor. Matanças, guerras, enganações, brigas e tudo que vemos nos jornais sobre a conviência dos seres humanos no mundo é o que acontece nas famílias, em formas mais brandas. É como se lutássemos incessantemente para nos convercermos que somos animais gregários e sociais até o limite do suportável. De fato o somos, mas nem tanto. Não é aceitável haver um casamento onde os casal more em casas separadas, tenha vidas separadas mas quando tem vontade de se encontrar, o fazem. NÃO. Tem que morar junto, acordar e dormir junto, transar com a mesma pessoa a vida toda, comer na mesma hora, ir nos lugares sempre juntos, lidar com as famílias do outro pela vida toda. Mesmo que em algum dos dias, qualquer um dos dois por motivos quaisquer, não queiram. Isto gera desconfiança, imaturidade, conversas paralelas e no limite, define a anteriori, que “o final da união está proximo”. Quem disse ? A voz da sabedoria social. 

Mas não é verdade. Millor Fernandes já dizia “como são maravilhosas as pessoas que não conhecêmos bem”. Esta frase é de uma inteligência ímpar pois inclusive é o motivo, na minha visão, da longevidade de alguns casamentos. Pessoas que mudam e mesmo assim continuam juntas é uma prova de ambos gostam das mudanças que acontecem no outro. E melhor, parece sempre um novo relacionamento. Mudanças fazem parte da vida e ficar casado por muitos anos com alguém que não muda, ou sofre para mudar, ou até resiste a qualquer mudança além de uma falta completa de conhecimento sobre a natureza humana, é de uma chatice enorme.

Mudar oxigena nossos neurônios, nos faz ver o mundo de outro jeito, rever nossos valores e questionar nossas atitudes todo o tempo. Nos faz voltar a sermos coloridos e interessantes. Mudar em última instância, define nossa existência neste planeta que está sempre mudando, evoluindo. Para a Terra, somos tão relevantes quando um sapo. Sapos não possuem a consciência da mudança. Eles mudam para se adaptar ao ambiente, mas para isto, milhões morrem todos os anos. Os mais aptos e que mudam mais rápido vão sobrevivendo. Nós, seres humanos, temos esta consciência e podemos mudar, claro, em algum nível de escala, quando decidimos. E esta atitude melhora nossa vida, pois é o entendimento do meio que vivemos que nos faz criar esta consciência de que devemos ou não mudar para ficarmos melhores e termos uma vida melhor.

As famílias, fora do nosso núcleo, neste sentido são até anti-naturais porque através de uma falsa premissa social, porém biologicamente verdadeira, os membros de uma família são o que são, e ainda são obrigados a conviver uns com os outros porque “somos geneticamente conectados”. Para quê ? Qual o objetivo ?

Não dá para desconsiderar o ambiente familiar e o próprio casamento com um dos maiores desafios que temos na vida. Maior até quase do que nossa vida profissional. E este desafio aumenta quando temos filhos. Como ensinar a uma nova vida tendo como ponto focal não uma verdade, um conceito e uma educação, mas dois pontos de vista e duas histórias de vida para tudo que se quer ensinar ? O termo paciência não possui nem de longe o peso semântico do que isto significa. É realmente foda.

Afinal, existem coisas que um dos dois sabe que pode dar certo porque já viveu aquilo. Como julgar uma decisão de alguém que nunca teve aquela experiência e mesmo assim não possui a humildade de aceitar a opinião de quem já teve ? Não dá. E às vezes, existem coisas que acontecem que internamente vemos que é como se fosse um barco que está indo em direção às pedras. Você já viu aquele filme, sabe o que vai acontecer e mesmo assim não pode fazer nada. Até poderia se resolvesse espernear, brigar pelo seu ponto e se estressar. Mas isto é muito cansativo. Um maldito psicólogo diria que o diálogo tem que prevalecer. Claro que sim, mas e quando o outro lado não quer dialogar ? Se cansa, não tem argumentos e não se interessa em desmistificar problemas, quebrar regras estúpidas e matar mitos ?

Não vejo solução plausível a não ser um dos lados acabar se anulando na educação dos filhos. É possível até criar uma fórmula teórica onde a duração de um casamento com filhos é inversamente proporcional ao nível de equidade que os pais possuem na educação deles. Isto siginifica que quanto menos um dos pais se envolver na criação e educação dos seus filhos, maior é a probabilidade do casamento durar.

No final, a escolha por manter um casamento é uma decisão pouco altruísta dos pais, pois se pensarmos em nossos filhos e o que melhor para eles, teremos um casamento que não dura e no final, temos que pensar se filhos de pais separados terão um dano psicológico maior do que quando ambos resolvem opinar sobre a criação deles. É uma equação difícil, sem dúvida. Se ambos opinarem e discutirem sobre o que melhor para os filhos, menos o casamento dura, pois mais discordâncias aparecem e consequentemente mais brigas e discussões entre os pais, o que mina o futuro.

Posso dizer que no meu caso, entendo hoje, depois de adulto a decisão do meu pai. Ele decidiu por manter seu casamento e absteve-se da nossa criação. Durante anos o critiquei muito por isto, mas como é bom passarmos pelos problemas para termos uma visão concreta dos desafios necessários para podermos opinar com qualidade.

Bem, este é um tema que poderia discorrer durante horas, mas cansei de escrever agora. Depois, se der, volto a ele.

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